sábado, 27 de março de 2010

Rehab para o coração.


Já dizia o poeta: quem tem alma não tem calma. isso se torna cada vez mais verdadeiro na fluidez em que vivemos. as pessoas demoram 35 anos pra se casarem e menos de cinco pra descasarem. é o fast romance, modalidade de relacionamento preferida dos modernos. a justificativa para esse padrão de comportamento reside em buscar a felicidade ao máximo, ainda que numa seqüência de doses mínimas. não vejo probelma nisso – pelo contrário: nada melhor, nada mais humano que ter fome de gente. tem um pequeno porém: quem vive amores líquidos acaba perdendo uma das partes mais bonitas das ligações afetivas – as celebrações.
Hoje em dia não se comemora mais aniversário de namoro simplesmente porque ele não é lembrado. são tantos inícios que a data passa a ser mais uma qualquer no calendário. bodas, então, nem se fala, pois elas nem chegam a acontecer. não falo de uma comemoração cafona com setenta parentes distantes parabenizando por anos de tolerância, mas da lembrança de que duas pessoas construiram algo bonito e assim o mantiveram durante meses, anos. trata-se de celebrar o humano, a vida e a convivência – esta principalmente, por raramente perdurar em nossa modernidade pastosa.
Festejamos natais muitas vezes sem saber direito o porquê, e isso os fazem datas especiais. por que não celebrar datas que marcam algo realmente extraordinário na vida de cada um de nós? por que limitar-se aos nascimentos? com champanhe ou guaraná, vale a alegria de sentir-se capaz de afeto, de deixar-se afetar pelo outro. talvez seja esse o xis da questão: hoje em dia ninguém mais se deixa descobrir. é mais fácil ficar em começos, nas primeiras descobertas sem deixar que o lado imperfeito do outro se revele. pra que cobranças e carências se há outro corpinho disponível logo ali? pra que calma e compreensão num mundo em que a superficialidade se mostra tão atraente por sua leveza? muito mais cômodo consumir pessoas da mesma forma que consumimos tecnologia ou peças de vestuário da estação.
Cada um sabe de si, e há fases em que amores não cabem. há os períodos de resguardo, de rehab para o coração, mas há corações que simplesmte desaprenderam (ou nunca aprenderam) a se deixar bater por alguém. por esses eu lastimo. não por conservadorismo ou idealismos de um romantismo inadequado, mas por acreditar que ter alguém capaz de nos fazer reunir forças pra mover o mundo é um sentimento único, uma razão pra encarar cada dia com a bravura de um gladiador. na verdade, talvez até seja inadequado esse meu romantismo, mas por entender que não há maiores explicações sobre de onde viemos e pra onde vamos, algo pra preencher cada respiro com significado pode sim ser de maior valor que qualquer coisa. ridículo? sim, como toda carta e amor. mas afinal, ridículo é quem nunca escreveu uma carta de amor – provavelmente por nunca ter sentido essa sensação orgasmática que descrevem como “carregar borboletas no estômago”.
Contra a fluidez da modernidade não há remédio, nem desejo que haja. interações instantêaneas podem ser muito positivas e prazerosas. ao lado de toda a efemeridade torço para que perdure aquele pedacinho de passado em que as pessoas acreditavam em poderem ser felizes para sempre ao lado de um par eleito; desejo com toda minha alma não ser uma das poucas últimas românticas de todos os litorais; rezo para que os amores perfeitos e imperfeitos se perpetuem além de poesias e canções. sem medo de ser clichê, e sem dúvida o sendo, desejo que todos os corações se embriaguem ao menos uma vez dessa coisa cafona que chamam de paixão. assim sendo, estou certa de que todos entenderão minha old fashioned ode às bodas. porque de descartáveis já chegam embalagens e artigos de higiene…

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