quarta-feira, 10 de março de 2010

Cerebro pra que te quero.


De um lado, duas prostitutas aposentadas. de outro, duas modelos. esse era o cenário de um debate do nada cult programa da luciana gimenez de um dia desses. a ordem do dia era humilhar tanto quanto possível as ex-profissionais do sexo: a discussão girava em torno do fato de algumas garotas de programa se anunciarem como "modelo", o que seria ultrajante para os reais cabides-ambulantes. para espanto e deleite do povão, inclusive esta que escreve, uma das ex-profissionais do sexo era absurdamente inteligente, e durante os 40 ou 50 minutos em que esteve naquele palco reduziu a pó os peões-de-agência que tentaram em vão demonstrar sua superioridade.
Valéria [ou vanessa] fez programa durante alguns anos e deixou a profissão para escrever um livro. foi tão bem sucedida que continua escrevendo até hoje e vive disso. na surra verbal que deu nas modeletes não defendeu a prostituição nem diminuiu a profissão de modelo. com opiniões sensatas e educação singular no debate, demonstrou que a inteligência feminina supera qualquer outro atributo quando se coloca frente a frente seres pensantes. no começo do programa ela era pequenina, feinha ao lado das divinas bonecas-de-cera; ao final do bate-boca reinava soberana naquele palco. colaboraram pra isso o narcisismo, a arrogância, a ignorância e, acima de tudo, a grosseria das beldades.
Primeiro as profissionais da moda se mostraram indignadas pelo fato de algumas prostitutas se intitularem "modelos", ao que valéria respondeu ser mais comum o fato de modelos se tornarem garotas de programa do que garotas de programa se apresentarem como modelos. depois disserem que seu trabalho era de altíssimo nível, enquanto o de uma das ex-prostitutas - cinema pornô e fotografias eróticas - carecia de dignidade e valor estético. valéria lembrou-as de que ambas tinham feito ensaios sensuais, deixando subentendido que isso não é propriamente fashion. polida, deixou de comentar que o portfolio de uma das modelos era muitíssimo semelhante ao da atriz. em seguida o ataque foi à indignidade da profissão do sexo, à degradação e à agressão dela decorrentes, ao que valéria, sem pudor algum, rebateu afirmando que na época em que trabalhava gostava do sexo pago. que mal há nisso? o tapa de luva final de valéria foi a pergunta à belíssima modelo de lingeries sobre o que ela faria quando se aposentasse, já que estava completando 32 anos. a loira prontamente afirmou que abriria uma clínica de estética, mas que não, não estava estudando pra isso; que não, não conhecia coisa alguma sobre o assunto; que não, não faria uma faculdade com os mais de 30 anos que tinha- que absurdo uma pessoa com essa idade estudar!, devia passar pela cabecinha oca e maquiada da moça -; e por aí prosseguiu a auto-sabotagem.
Valéria em momento algum se insinuou superior às demais mulheres, embora a certa altura do barraco essa superioridade fosse gritante. poderia ter apedrejado o teto de vidro da estúpida mulher que vive de mostrar a bunda em ensaios sensuais e desfiles de roupa íntima, o do poço de narcisismo de beleza meia-boca e língua mais ágil que o cérebro, e até o da divina modelo que acertou na loteria ao se entregar aos prazeres da cama com mick jagger num dia fértil - teria sido ela contratada pra enfeitar um after show dos stones?
Eu não defendo a prostituição da forma como ela ocorre no brasil, mas não a condeno como opção de vida. condeno sim a hipocrisia e o equivocado senso de superioridade de certas mulheres - geralmente as bonitas. não vejo tanta diferença entre anunciar a venda de sexo e namorar os donos do pão de açúcar. acontece que os pegadores de modelos seriais desse naipe têm um padrão de exigência estética elevado. como conseqüência, às que não foram abençoadas com a beleza sobrenatural de uma cicarelli, resta recorrer a meios menos sutis de fazer seus corpinhos renderem algum conforto material. no fim das contas, fica claro que enquanto algumas mulheres vivem do corpo sem saber que poderiam ser muito bem sucedidas às custas de seu intelecto, outras se enganam profundamente ao acreditarem que passarela e flashes são opção sua - e não a única possibilidade que lhes resta face ao seu baixo desenvolvimento humano e intelectual.

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